No
corpo trazias um vestido coberto de incertezas, na cabeça um lenço
cheio de dúvidas. Na mão trazias um chapéu de sol que projetava uma pequena sombra. Eras
tu essa mesma sombra.
Ao longe uma voz fazia-se ouvir, como o murmúrio de uma cascata a grande distancia,
ou
como a rebentação das ondas que se ouvem por entre as copas das árvores numa
floresta costeira. O ar estava quente e húmido, caribenho, mesmo antes da tempestade.
E a voz chamava por ti. Tu imóvel,
escutavas de olhos fechados e sorrias como se ouvisses música. Eu pressentia nervoso
que a voz te atraía para si. Tu imóvel, de olhos fechados, sorrias iluminada
por relâmpagos de uma trovoada silenciosa. E escutavas e
escutavas.
Entraste numa casa de madeira que ardia
devagar. Acendeste a luz alaranjada que refletia tremeluzente as chamas por uma
ampla janela. E vi-te despir as incertezas e as dúvidas ao por-do-sol. E a voz
calou-se. O ar continuava quente e húmido e o céu saturava-se de nuvens espessas. Penteavas os cabelos, escovando o que
restava de mim em ti. Pó. Um pó que caía cintilante no chão e que o movimento
do ar quente levava para longe, como uma velha recordação antiga e perdida no
tempo.
Ainda nua colocaste duas flores de
laranjeira, uma no coração, outra no flanco. O cheiro invadiu o meu sonho e ouvia-se um
saxofone tocando blues à distância, encurralando os sons da noite que se
dissipavam, espessos por entre as notas.
Voltaste a sair da casa que se
desmoronava lentamente, consumida pelas chamas e pela tristeza, e dançavas.
Dançavas nua, apenas coberta pelo luar reflectido nas nuvens, como se
estivesses submersa num imenso oceano. E dançavas devagar por entre as sombras.
E
vi-te desvanecer como um fantasma,
E
vi-te desvanecer como um fantasma,
E
vi-te desvanecer como um fantasma...
©Alexandre
Rodrigues 2013
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