Entre o limpar dos pratos e os mantras do
jazz,
As mãos espumosas de sabão.
Na noite ergue-se da hora desamparada
(guardo-a para mim o final do dia)
A meditação que se arriba em ondas,
Umas alteadas, encristadas,
Outras mais profundas e cavadas.
É nesse ensejo meditadiço
Que um estranho arroubo
Antigo e profundo se ocupa de mim.
De tal modo furtivo
Que a chegada nem é anunciada.
E é por demais estranho tal cogito,
Eleva-se nessas horas mundanas,
Das domésticas tarefas na quietude da casa.
Um niilismo neste meu singular cosmos,
D’alma nunca sarada, nunca, de nada.
Um sentimento antigo se ergue
De carestia, de incompletude.
Como arma que dispara,
Sete dardos de coisa-nenhuma,
Nas areias desertas em flancos de bruma.
Mas o que ora vai escorrendo, devagar,
Como lava morna numa canada,
É não mais que saudade de nada,
Um vago ‘ah se ao menos soubesses’.
Como eu te imagino nesta hora parada:
O que estarás debaixo da lua cogitando,
Num longínquo sofá, de perna traçada.
©2016 Alexandre Alves-Rodrigues