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terça-feira, 8 de março de 2011

Synecdoche, New York. Muito provavelmente o filme da minha vida.

Já alguma vez viu um filme ou leu um livro que assenta como uma luva na sua vida? Se até aqui tinha "O Amor em Tempos de Cólera" como o meu livro favorito, que retrata a vida de um homem cujo objectivo maior era o de voltar a ter a única mulher que sempre amou e logo, o controlo da sua própria vida; pelas razoes exactamente opostas Synechdoque, New York passou a ser o meu filme favorito.

A fantástica história de Caden Cotard, um director teatral que perdeu o rumo da sua vida, vivendo cronologicamente desorientado, fisicamente em decadencia, e angustiosamente  a tentar controlar o seu destino no dia em que a sua esposa, uma artista plástica o deixa para ir viver para Berlim.
Esta é a linha de charneira do filme: o momento em que Adele parte para Berlim com a filha do casal. A partir daqui é o descontrolo emocional, físico e temporal de Caden, a quem mais tarde é  atribuído um prémio  teatral monetário que é totalmente investido numa peca de teatro replicando a sua vida ‘a escala real, na cidade de Nova York dentro de um velho armazém, numa frustrada tentativa de voltar a controlar o rumo perdido da sua vida.
As analogias e as relações sucedem-se, a casa da amante de Caden sempre em chamas, os quadros miniatura de Adele em Berlim cada vez mais pequenos ao mesmo tempo que o armazém em Nova York se torna cada vez maior. As relações frustradas com outras mulheres, a contratação para fazer o papel de Caden na peca, de um homem que o persegue há dezassete anos e que o compreende melhor do que ninguém. Algum Jungianismo aqui com uma pitada de Hegel. Tudo ‘a volta da ilusão de um dia voltar a ver Adele.
No fundo um filme que se dedica ao “e se…” E se eu tivesse escolhido um caminho em vez de outro o que seria a minha vida? E se eu tivesse tomado uma decisão diferente o que teria acontecido? No fundo o filme nos mostra que apenas temos controlo decisório sobre as nossas vidas nos momentos em que somos confrontados com encruzilhadas (as chamadas encruzilhadas da vida, que muitos poetas já dedicaram inúmeros versos). Uma vez escolhido o caminho, certo ou errado, não há volta a dar, perdemos o controlo e temos de aguentar com o resultado das nossas decisões. Muitas vezes parece que a nossa vida é um sonho dentro de um sonho, e apesar de estar dentro da nossa mente, não o conseguimos controlar, o filme com certeza que o é.

Tal como Caden, também já olhei muitas vezes para trás e pensei em voltar a tomar o controlo das decisões que tomei (ou que não tomei); voltar atrás e decidir diferente. Tentar imaginar o que seria a minha vida se… Este filme mostrou-me que é inútil. Também não tenho o controlo do rumo da minha vida como desejaria, viajo por ela como se num barco a descer um rio ao sabor da corrente e olhar a paisagem e as pessoas a mudar ‘a minha volta. Tentar alterar isso (voltar para trás e apanhar o outro barco) apenas tem adicionado infelicidade ‘a minha existência (armazéns por cima de armazéns a replicar o que nunca foi).
Saborear a paisagem que se vai abrindo, mesmo que por vezes escura e medonha, é algo que se aprende com o tempo e com as feridas da vida. Afinal, como diz o padre no monólogo do funeral  da peca de teatro de Caden e que no fundo resume o filme e as nossas vidas (http://www.youtube.com/watch?v=Z9PzSNy3xj0): de todo o tempo que passamos  na Terra, na maior parte dele ou estamos mortos ou ainda não nascemos. E apenas vivemos uma fracção de segundo. Para quê desperdiçar o nosso tempo ‘a espera daquilo que nunca vem? Da promessa, do telefonema, da carta, do email, para depois vivermos ressentidos e tristes e angustiados.   

Afinal o destino existe, mas somos nós que o fazemos. Há filmes que nos assentam como uma luva. Este assentou-me perfeitamente.

2 comentários:

  1. «...um barco ao sabor da corrente...»

    mas de vez em quando temos a oportunidade de escolher entre várias correntes. No fundo, a nossa trajectória é como uma soma vectorial entre as escolhas que fazemos e as circunstâncias que não controlamos (a que chamamos 'acaso', que é uma palavra chique para designar a nossa ignorância). Importa é nunca abdicarmos da nossa componente/parcela de escolha, nem colocá-la à vontade de outras pessoas ou organizações. Afinal, a realidade é muitas vezes «uma iteração mal sucedida», e às vezes surgem novas encruzilhadas que permitem reaproximarmo-nos do nosso caminho.

    E a experiência mostra que se pode estar hoje a fazer furos em moldes de plástico e passados 6 anos, estar a dar aulas numa universidade britânica ;)

    Belo comentário de um extraordinário filme.

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  2. Parece ser interessante. Vou colocar na "lista" do supermercado...

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