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sábado, 24 de março de 2012

Soluções para Portugal 2. Ou como um holandês e uma multinacional de computadores ajudam-nos a perceber (de modo sistematizado) porque somos como somos.


Quando Geert Hofstede chegou à IBM no final dos anos sessenta, depois de ter recebido um doutoramento cum laude da Universidade de Groeningen começou por criar inquéritos sobre satisfação laboral e entrevistou pessoas em mais de setenta países onde a IBM estava presente. Hofstede queria perceber com se comportavam as pessoas e como colaboravam entre si. Mais tarde os milhares de dados que recolheu e posteriores pesquisas em psicologia, antropologia, sociologia e ciências politicas desaguaram na obra de referencia “As Consequências da Cultura” (http://www.amazon.co.uk/Cultures-Consequences-Comparing-Institutions-Organizations/dp/0803973241/ref=sr_1_2?ie=UTF8&qid=1332624430&sr=8-2). Esta obra sistematiza e compara as diferentes culturas de trabalho de diferentes países. Mesmo os maiores críticos de Hofstede ainda estão por publicar uma obra de referência que se sobreponha a este verdadeiro compêndio cultural. A obra teve tal impacto que mais tarde Hofstede teve de incluir mais países na sua lista, e acabou por publicar “Culturas e Organizações: O software da Mente”( http://www.amazon.co.uk/Cultures-Organizations-Intercultural-Cooperation-Importance/dp/0071664181/ref=pd_sim_b_1)
Hofstede nunca procurou criticar esta ou aquela cultura, apenas perceber as causas e o porquê de certos povos comportarem-se de determinada maneira, e o porquê de certos choques culturais que muitas empresas (como a IBM) enfrentam quando se internacionalizam. Assim sendo concebeu as quatro dimensões culturais presentes em todos os países e culturas: Distância do Poder, Individualismo versus Colectivismo, Masculinidade versus Feminilidade e Aversão à Incerteza. Mais tarde um outro investigador Michael Bond inclui “Curto versus longo-prazo”, depois de ter estudado trabalhadores e empregadores chineses. Em 2010 uma nova dimensão foi incluída mas ainda não aparece em nenhum estudo “Indulgência versus Restrição”. A organização GLOBE tem feito um estudo continuo sobre as culturas e países e desenvolveu mais dimensões como por exemplo, orientação humana: altruísmo, generosidade, etc. No entanto para este post ficar-nos-emos pelas cinco dimensões propostas por Hofstede.
Distância ao poder tem a ver como as sociedades aceitam a distribuição do poder. Em sociedades com grande Distância ao Poder o poder é distribuído de forma desigual e as pessoas aceitam essa desigualdade. Poderemos dizer por exemplo que quanto maior a distância ao poder maiores as desigualdades salariais. Em países ou culturas com pouca distância de poder as pessoas exigem saber porque o poder foi distribuído de certa maneira e empenham-se em nivelá-lo. Um exemplo de pouca distância ao Poder é a Dinamarca.  
Individualismo versus colectivismo é o grau ao qual os membros de uma sociedade são integrados em grupos dos quais dependem. Em países individualistas é esperado de cada pessoa que saiba tomar conta de si própria sem depender de grupos alargados para o ajudarem e do qual esperam lealdade. Aqui colectivismo é cultural e não por imposição politica. Países com altos graus de colectivismo são as nações do extremo-oriente: China, Coreias, Japão.
A masculinidade versus feminilidade representa a preferência de uma sociedade por heroísmo, conquista, recompensa material ao inverso de cooperação, modéstia ou qualidade de vida. Masculinidade está inversamente relacionado com o número de mulheres a ocuparem cargos de relevo na sociedade, um exemplo de um país onde a masculinidade é prevalecente chama-se Áustria.
Aversão à incerteza estará relacionada com normas sociais de procedimento como por exemplo a obrigatoriedade do uso de cartões de identidade em certos países. Assim retira-se uma certa pressão da sociedade sobre eventos futuros e controlam-se melhor os cidadãos. Países deste género são intransigente e com códigos de fé ou opinião muito fortes. Por norma são intolerantes a ideias ou comportamentos fora da norma. Portugal e a Grécia figuram no top deste tipo de países
Finalmente curto versus longo prazo estará relacionado com sociedades que buscam a verdade absoluta, por norma tradicionalistas e de pouca propensão à poupança versus aquelas que adaptam as tradições aos tempos, onde a verdade depende das situações ou dos contextos e os elementos destas sociedades têm tendência a poupar e a investir no futuro.  São sociedades perseverantes. Mais uma vez países como a China figuram no topo da lista de países que pensam a longo-prazo.
A lista de dimensões de Hofstede é por certo generalista e muitos dirão limitativa, mas extremamente útil aquando queremos compreender a razões por detrás das escolhas politicas, da história, e mesmo da visão que cada país tem de si e do mundo. É uma ferramenta muito útil quando se viaja em negócios ou em lazer a um país estrangeiro. 


Quando analisamos Portugal verificamos que o país obtém um valor médio no que respeita à distância ao poder, certo que existem muitas desigualdades mas a sociedade não aceita muito bem essas desigualdades e é muitas vezes critica das mesmas. Pena ser tão passiva em relação a isso.  Quanto à segunda dimensão somos um país bastante colectivista, temos a necessidade de pertencer a um grupo, colectividade, religião, etc. Nada de negativo nisto, mas o reverso da medalha é a nossa falta de capacidade de auto-responsabilização, o fugir aos deveres, o pensar por si mesmo. Um dos factores positivos que Portugal aparenta ter é uma alto índice de feminilidade, onde a cooperação e a qualidade de vida são valores que a sociedade portuguesa em geral preza, e a participação das mulheres na sociedade (já de si ancestralmente matriarcal) é elevada.  Já a modéstia… O valor onde Portugal apenas é batido pela Grécia é o da Aversão à incerteza. A intolerância por pessoas ou ideias diferentes não espantará muitos, ainda somos um país periférico onde tudo o que foge à norma é apontado a dedo, não raras vezes escarnecido e na maioria das vezes ostracizado. Em Portugal, tanto quanto sei, dá-se muita importância ao que os vizinhos pensam de nós. O uso de cartão de identidade é obrigatório, assim como o uso de outros cartões. Em Portugal as carteiras andam cheias de cartões alimentadores da máquina burocrática mas vazias de dinheiro alimentador das bocas e do bem-estar. Finalmente na orientação a longo-prazo Portugal marca pouquíssimos pontos. Perdemos a capacidade de poupar, buscamos as verdades absolutas, nem que seja à força de teorias da conspiração, onde muitas vezes ambas não existem, e estamos agarrados às tradições, às velhas ideias, nem sabemos bem porquê, talvez porque assim (pensamos que) controlamos o futuro, quando afinal estamos à mercê do mesmo e das voltas que a roda da vida dá. Outro dos factores dos países com visão a curto-prazo é o pouco valor que dão à educação e ao investimento na mesma (afinal, têm dificuldades em poupar). Os resultados estão à vista…
Penso que são estas duas últimas dimensões que precisam de ser repensadas no nosso país por cada indivíduo, isto se se conseguirem afastar um pouco do colectivismo. São elas que dão razão aos leitores de Ramalho Ortigão e Eça de Queirós que facilmente se apercebem o quão Portugal pouco mudou em mais de cem anos, mesmo que os sociólogos digam o contrário. São elas que empenam as engrenagens e nos fazem dar tiros nos pés. São essas mesmas dimensões (e aqui também o talvez excessivo colectivismo) que nos obriga a levar com esta “democracia” de caciques e seguidistas, onde independência pensamento e de voto é coisa realmente desconhecida, ou atabalhoadamente colocada de parte. São elas que nos retiram o orgulho de sermos portugueses, que nos fazem parecer patéticos e pouco convictos aos olhos do mundo. As dimensões de Hofstede não são imutáveis como certas “verdades”que por aí pululam. Elas mudam, mas só com o tempo e a vontade dos povos. E isso leva muito tempo. É um investimento a longo prazo que cada individuo tem de fazer e nada nos garante que, no futuro resulte. Mas temos de perder o medo.

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