Número total de visualizações de páginas

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Do meu livro favorito

“Com ela aprendeu Florentino Ariza o que já padecera muitas vezes sem saber: pode-se estar apaixonado por várias pessoas ao mesmo tempo, por todas com a mesma dor, sem trair nenhuma. Solitário entre a multidão do cais, dissera a si mesmo com um toque de raiva: ‘O coração tem mais quartos que uma pensão de putas.' Estava banhado em lágrimas com a dor dos adeuses. Contudo, mal desaparecera o navio na linha do horizonte e a lembrança de Fermina Daza tinha voltado a ocupar seu espaço total.”

trecho de O Amor nos Tempos do Cólera
Gabriel Garcia Marquez

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Cameron e a Big Society


O primeiro-ministro David Cameron nunca me convenceu nas suas intenções antes da eleições, e os meus piores receios (que ele fosse um primeiro-ministro ao estilo português) começam a tornar-se realidade.
Quando alguém diz que tem uma ideia de criar uma “Grande Sociedade” ou “Big Society” como Cameron lhe chama dizendo que quer devolver o poder ‘as autoridades locais é de desconfiar, principalmente vindo de um Tory. Mas o pior nisto é como a coisa esta a ser dirigida e apresentada (como se fossemos todos burrinhos ou com 5 anos de idade).
Como é que alguém pode ter a desfaçatez de querer devolver o poder local aos municípios e ao mesmo tempo corta os fundos aos ditos. Neste momento estão em perigo de fechar por todo os pais milhares de bibliotecas, ginásios, centros de dia, etc. devido aos cortes anunciados. Só em Liverpool (um dos municípios mais pobres e com uma das maiores taxas de desemprego no Reino Unido) vão ser cortados £91 milhões.
Cameron tem incentivado a população a fazer trabalho comunitário, ou por outras palavras, se quiserem as bibliotecas abertas trabalhem de graça e não se queixem, num clima em que o IVA aumentou para 20%, os números do desemprego continuam a subir e os jovens licenciados não encontram trabalho (meu Deus eu já vi este filme), os combustíveis aumentam diariamente e ainda querem adicionar uma sobre-taxa ao imposto sobre combustíveis em Abril, a inflação já vai nos 4%, para o ano que vem são os cortes nas universidades com os tectos das propinas de £3,500 para £9,000 anuais, e os inevitáveis encerramentos de  cursos, especialmente nas Universidades mais pequenas cujos alunos vem de famílias com poucos rendimentos (ao contrario dos meninos de Ox-Bridge como Cameron e toda a escumalha Tory). O ministro das Finanças (outro menino do papá) afirmou que estamos todos juntos nisto pouco tempo antes de ter ido passar umas ferias de Natal de £7,000 num resort de luxo na Suíça e de se saber que as suas empresas estão todas sediadas em off-shores.
O resultado será o fim da mobilidade social iniciada nos anos 60 num pais que ainda subtilmente é dividido em três classes, uma clique de governantes filhos de papás (estupidamente) ricos saídos de Ox-Bridge, um povo que vai voltar a condições de trabalho muito semelhantes ‘as da revolução industrial (se bem que sem a fuligem), o fim da “classe média” e um fosso cada vez maior entre ricos e pobres ( meu Deus eu já vi este filme).
Na melhor das hipóteses nas próximas eleições legislativas os Britânicos voltam para os trabalhistas de novo (um mal menor). Nos tempos da “Maggie Thatcher”, de tão má memória, o trauma foi de tal modo grande devido ‘as vagas de desemprego que gerou, que desde então, na Escócia os Tories não elegem nem um deputado. Obstinados, estes Escoceses.
Se Portugal precisa já de uma revolução, o Reino Unido precisa de uma reviravolta muito grande (porque aqui não há memória de revoluções) para tirar de lá este fantoche que vai enterrar o resto deste pais no lamaçal.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Velhice III


Os meus leitores pensarão que estou obcecado com este tema, mas os acontecimentos dos últimos dias têm-me feito pensar por demais no assunto, não só na senhora que estava morta há nove anos mas especialmente no estado das nossas sociedades. Estes factos são uma excelente analogia do que se passa nelas. Uma sociedade onde as pessoas com mais de 30 anos são consideradas demasiado velhas para trabalhar (porque têm experiência (a mais) e logo deveriam ser mais bem pagas, e por isso mesmo estão a ser postas de parte). Uma sociedade, onde devido 'a aculturação americanizada do qual fomos todos alvo especialmente depois da II Guerra Mundial e depois de uma niponizacão da industria a partir dos anos 70, apenas olha para o seu umbigo, quer vencer a todo custo e a passar por cima de todos, onde o culto da perfeição e da juventude imperam e uma desumanização gradual da sociedade relega fatias importantes da mesma (e do mercado) para um canto obscuro da existência. É pois esta sociedade que deixou Augusta Martinho jazer morta durante nove anos em  casa sem que (quase) ninguém se preocupasse.

Ninguém deu por o corpo cheirar mal. Numa sociedade podre como a nossa, os maus cheiros misturam-se, é natural que ninguém desse por nada.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Velhice II


Pior que saber que a velhice chegou (ver post sobre o assunto aqui) é chegar a velho e não conseguir lidar com as novas tecnologias.
O meu pai, hoje com 74 anos, sempre esteve relativamente actualizado com isto dos computadores. Muito lentamente aprendeu a mexer neles já depois dos 60 (o meu pobre cunhado que o diga). No entanto ultimamente tem-me preocupado o facto de nesta semana já ter criado duas vezes contas no Facebook, duas no Skype (ou Skip como ele lhe chama). Não que o meu pai esteja senil (a minha mãe não tem a mesma opinião), mas porque para um homem da idade dele memorizar tantas passwords torna-se complicado. Certo que ele vem da geração que aprendia tudo de cor (desde a tabuada até aos números de telefone de familiares e amigos), mas a idade também não perdoa, as faculdades já não são as mesmas e isto para ele é tudo muito frustrante.
O que me preocupa, que sou da geração "Y-depois rasca-depois €500-agora ‘a rasca-no futuro mendiga", é um dia chegar ‘a idade do meu pai e tentar gerir a tecnologia (nem consigo imaginar qual) desse tempo e sentir-me tao ou mais frustrado que ele. Não me vou conseguir actualizar, vou ter de ir ‘a porcaria da internet (tal como o meu pai vai ao Correio da Manha) se quiser saber de um modo muito limitado o que se passa no mundo e nas constelacoes mais proximas, e nessa altura não se vai poder mais confiar nela (tal como hoje o meu pai não confia nos jornais). Vou concerteza esquecer o que quer que seja que substitua as passwords, talvez reconhecimento atravez da iris (quero ver depois, cheio de cataratas nos olhos como vai ser), ou outra porcaria qualquer que, com o deterioramento que a idade traz ‘as celulas humanas não me vai reconhecer e tenho de abrir contas (ou qualquer outra cagada que vao inventar) todas as semanas.
O que me consola nisto tudo, como não vou ter reforma (porque o Estado vai estourar tudo e a empresa onde tenho os meus PPR vai falir numa próxima crise financeira),  não vou ter dinheiro para me meter nessas aventuras e vou ter ter mais tempo para conversar com os meus amigos (aqueles que ainda não tiverem morrido).
E tenham medo, muito medo. Muahahahahahah.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Science’s First Mistake. Delusions in Pursuit of Theory



Estive hoje na Universidade onde agora dou aulas a assistir a uma interessante palestra com um dos autores deste livro (o outro esteve presente via Skype) sobre a desconstrução do processo de conhecimento e a subsequente teoria, ou seja a discussão das circunstancias pelas quais todos os princípios científicos são construidos. As implicações para a teoria e o método foram discutidas contra quatro conceitos fortemente interrelacionados e que são de interesse para todas as disciplinas cientificas: observação, paradoxo, ilusão e acima de tudo auto-referencia.
Ao conversar com o professor  Ian Angell fiquei com a impressão de que para ele nem a ciência nem a religião se podem auto-proclamar como absolutas, porque se auto-referenciam e porque partem de observações limitadas da realidade que não correspondem necessariamente ‘a verdade. No entanto ele não é contra a ciência nem contra a religião (porque úteis dentro de certos contextos), apenas alerta no livro para os perigos que certos conceitos matemáticos e por isso abstractos levam alguns cientistas a quer “forçar” uma realidade que não existe (o infinito, realidade quântica, universos paralelos, o zero). Como perguntou Einstein, porque é que a física tem de se basear em conceitos matemáticos?
Com muitas referencias a grandes filósofos e cientistas que ajudam a por em causa alguns dos actuais métodos científicos este é um livro certamente polémico que deve ser lido por cientistas e por aqueles que tem interesse e curiosidade na ciência.
O livro está disponível em PDF gratuitamente em: http://sciencesfirstmistake.files.wordpress.com/2010/07/sciences_first_mistake_angelldemetis.pdf ou se quiser gastar dinheiro também existe em formato papel na Amazon.co.uk
Para uma melhor compreensão das ideias dos autores vale a pena também visitar: http://www.sciencesfirstmistake.com/









 Ian Angell é Professor de Sistemas de Informacao na London School of Economics. 

 




 Dionysios Demetis é professor associado no Grupo de Sistemas de Informacao na London School of Economics.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Revoluções no Norte de África. Algumas considerações.

Os acontecimentos dos últimos dias em países do norte de África tem feito correr muita tinta. Serão preferíveis as ditaduras nacionalistas (apoiadas pelo ocidente) que mantêm controladas os islamistas ou democracias (exigidas pelos povos destes países) que poderão facilmente cair em extremismos como já aconteceu em outros países muçulmanos? 

A resposta é muito simples e tem muito a ver com as vagas de emigração destes países para a Europa. É certo e sabido que com desenvolvimento as taxas de emigração caem. Ninguém emigra do seu pais (e no caso dos norte-africanos com grande risco pessoal) a gosto. Se não há oportunidades, e o sentido de injustiça impera é muito natural que aqueles que não querem pactuar com o que se passa e não se conformam, não tenham outra solução a não ser tentar sua sorte em outras paragens. Seria então natural a Europa apoiar esta revolução, e no entanto apenas se vem tímidas declarações dos lideres europeus (pseudo-democratas-batedores-no-peito) e muita hesitação acerca destes acontecimentos. 

A Europa que se vê a braços com a imigração ilegal vinda destes países deveria estar na linha da frente no apoio ao seu desenvolvimento e consequente queda de vagas de imigrantes ilegais, continua a hesitar, como continua a hesitar em outros problemas, porque é gerida de Bruxelas por gente obscura, demasiado imiscuída em negócios obscuros no geral e com estas obscuras ditaduras em particular (quanto maior o risco, maior o lucro, qualquer gestor sabe isto). As grandes vagas de imigração servem apenas os grandes grupos económicos para baixar o preço do trabalho (lei da oferta e da procura) e fazer os nativos do pais sentirem-se ameaçados e abrirem mão dos benefícios que tem. De outro modo a Europa já teria apoiado medidas mais fortes de modernização e desenvolvimento destes países (em ditadura ou não). Os povos do norte de África são em regra mais instruídos do que em outras paragens e mais laicos também, fruto destas mesmas ditaduras nacionalistas saídas da Segunda Guerra Mundial (sendo a Líbia uma das excepções), em tempos apoiadas pelos regimes comunistas.

O medo cego acerca do radicalismo islâmico é bastante infundado (embora não se deva descartar de todo) e propagado pelos apoiantes (locais ou estrangeiros) dessas mesmas ditaduras. Estes povos querem verdadeiras democracias ao estilo europeu (não aquilo que temos hoje em dia no Velho Continente) e sabem bem que só assim se poderão desenvolver. Consegui-lo-ao? Só o tempo e o rumo dos acontecimentos o poderá dizer.